segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Certame - Feira Alheira de Mirandela

Para os residentes na zona do Porto, nada como aproveitar para fazer uma visita à Feira da Alheira de Mirandela, que irá decorrer na  Alfândega do Porto. 
Uma oportunidade para aqueles que querem matar as saudades dos produtos gastronómicos da nossa região. 
Para os que não conhecem uma oportunidade para se deleitarem com os produtos do Nordeste Transmontano, no caso as alheiras de Mirandela. 


domingo, 20 de janeiro de 2013

Alheiras

Tinha já comprado as regueifas (Regueifa é um pão de trigo em forma de roda e cujo miolo é muito compacto) ao padeiro, que se deslocava como habitualmente à aldeia e adquirido as tripas (normalmente de vitela) na taberna da tia Maria, já que as tripas do porco eram destinadas ao restante fumeiro (salpicões; linguiças e bucheiras – feitas com carne fresca devidamente temperada) que a minha mãe pretendia fazer. 

Habitualmente fazia mais alheiras para mandar para França para os meus tios e irmãos, que estavam sedentos delas, até porque a minha mãe tinha uma mão aprimorada para fazer alheiras, linguiças, salpicão e outro fumeiro. A carne era toda ela caseira (porco e galinhas criados em casa). 

De manhã bem cedo já os utensílios utilizados estavam devidamente limpos e prontos para essa tarefa que deveria iniciar-se e concluir-se no próprio dia. 

Atempadamente tinha já preparado as varas que iriam receber o fumeiro, que seria depois pendurado na lareira, para secar. Um cenário que sempre apreciei apesar do fumo que por vezes me impregnava. 

O lume crepitava com bastante intensidade, estando os potes ao lume já cheios de água. Logo que começavam a ferver com intensidade, as carnes eram ali colocadas para cozer. Vários ingredientes (alho, sal, pimenta e talvez outros condimentos – era mais de comer do que ver como se fazia) eram ali colocados para temperar a carne e dar-lhe aquele sabor inconfundível e caseiro. 

As carnes eram bem cozidas porque a qualidade da calda segundo dizia a minha mãe e as mulheres da aldeia que faziam as alheiras todos os anos, obtém-se através de uma cozedura adequada, dependendo a qualidade do produto final desse processo.

Enquanto coziam as carnes, cortava-se as regueifas de pão para dentro de um alguidar grande, deixando-se as mesmas soltas e prontas para serem banhadas pela calda que as iria acariciar. 

Logo que as carnes estivessem cozidas, eram retiradas da calda, cortadas aos bocadinhos, desossando-se as carnes por completo. Claro que ia aproveitando para comer pequenos pedaços de carne com a desculpa de verificar o sabor. 

Depois de aferir-se se a calda estava bem temperada de sal, deitava-se a calda sobre o pão, utilizando-se um coador para evitar que algum osso fosse para aquilo que seria a massa das alheiras. 

A minha mãe tinha o cuidado de deixar o pão bem molhado, mexendo a calda e o pão com a colher para obter consistência na massa, juntando-lhe as carnes, temperando depois com pimenta moída, colorau doce e penso que com picante. 

Os alhos desfeitos eram colocados na massa que depois eram regados por azeite a ferver, mexendo-se novamente a massa com a colher de pau. 

Depois da massa pronta, já munidas dos aventais e dos lenços na cabeça as mulheres, no caso a minha mãe e irmã, começavam a enchouriçar as alheiras nas tripas de vitela. 

Concluída a estafante tarefa, colocava as alheiras nas varas e pendurava-as apoiadas em dois barrotes paralelos, onde as alheiras recebem o calor da lareira que fará com que sequem e fiquem prontas algum tempo depois para serem consumidas. 

A alheira fumada é a verdadeira alheira transmontana, pode comer-se da ramada (vara do fumeiro); conservada em azeite ou guardadas nos congeladores (coisa que não aprecio). 

Depois de secas deleitava-me retirando a alheira da vara, tendo previamente colocado a grelha ao lume, aconchegando as brasas para receber a alheira. Esta com o calor por vezes “rebentava” e a massa saia, pelo que as furava para expelir o azeite. 

Acompanhava muitas vezes a alheira com couves e batatas ou então com grelos, bem regados faustosamente com o azeite colhido nos nossos terrenos. Era um repasto como já não conheço …

Essas sim eram e ainda são, porque felizmente ainda existem pessoas que fazem as alheiras de forma tradicional em Trás-os-Montes, alheiras com um sabor inigualável e com uma qualidade reconhecida nos vários certames gastronómicos nacionais e internacionais. 

















Fotos: 
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João Salvador – 20/01/2013